quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Genealogia 355: de Norte Grande para o Rio Grande

No site Centro de Conhecimento dos Açores ( http://pg.azores.gov.pt/drac/cca/ig/ ), estão disponibilizados diversos registros paroquiais de freguesias açorianas. "Garimpando" no acervo da freguesia de Nossa Senhora das Neves do Norte Grande, encontrei assentos relevantes para genealogias gaúchas, com colonizadores ilhéus da Região.

1) TOMÉ CARDOSO DE MENDONÇA E MARIA DO ROSÁRIO PEREIRA

Primeira Geração

1. Tomé Cardoso de Mendonça nasceu em 17 dezembro 1715 em Ribeiras, ilha do Pico. Ele faleceu em 26 dezembro 1793 em Porto Alegre-RS.

Tomé casou-se com (1) Maria do Rosário Pereira. Maria nasceu em Ribeiras, ilha do Pico.

Eles tiveram os seguintes filhos

2 F i. Maria nasceu em 1745 em Ribeiras, ilha do Pico.

3 M ii. Pascoal de Souza Cardoso nasceu em 6 abril 1749 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizado em 9 abril 1749 em Norte Grande, ilha de São Jorge.
Pascoal casou-se com Josefa Maria de Carvalho, filha de Miguel Teixeira de Carvalho e Maria da Conceição. Josefa nasceu em 19 abril 1755 em Rio Grande-RS.

4 F iii. Joana Maria nasceu em Ribeiras, ilha do Pico.
Joana casou-se com (1) Fernando José da Gama (não casaram).
Joana também casou-se com1 (2) Antônio de Souza, filho de Amaro de Souza e Catarina Teixeira. Antônio nasceu em Ribeira Seca, ilha de São Jorge.

5 M iv. Manuel nasceu em Ribeiras, ilha do Pico.

Tomé também casou-se com1 (2) Isabel Maria da Conceição, filha de Manuel Machado Leão e Luzia Maria de São José. Isabel nasceu em Norte Grande, Ilha de São Jorge.

Eles tiveram os seguintes filhos

6 F v. Ana Maria do Nascimento nasceu em 24 fevereiro 1755 em Rio Grande-RS.
Ana casou-se com (1) Manuel de Medeiros da Costa Reis, filho de Pedro Medeiros da Costa e Isabel dos Reis. Manuel nasceu em Parnaíba-SP e foi batizado em 4 agôsto 1735.
Ana também casou-se com1 (2) João Rodrigues de Campos, filho de Maurício da Rocha Campos e Josefa dos Reis de Cubas e Mendonça. João nasceu em Santana do Parnaíba ou Taubaté-SP.

2) MANUEL MACHADO DE BORBA e CATARINA MARIA DO ROSÁRIO

1. Felipe de Borba da Cunha.

Felipe casou-se com Maria Machado Vieira.

Eles tiveram os seguintes filhos

+ 2 M i. Manuel Machado Borba.

Segunda Geração

2. Manuel Machado Borba (Felipe de Borba da) nasceu em Calheta, ilha de São Jorge.

Manuel casou-se com Catarina Maria do Rosário, filha de Antônio Sanches Maciel e Maria Nunes, em 9 janeiro 1747 em Norte Grande, ilha de São Jorge. Catarina nasceu em Norte Grande, ilha de São Jorge.

Eles tiveram os seguintes filhos

3 F i. Rosa Maria nasceu em 29 agôsto 1747 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizada em 3 setembro 1747 em Norte Grande, ilha de São Jorge .
Rosa casou-se com José de Souza Dias do Nascimento (=José Dias Gonçalves), filho de Simão Dias Gonçalves e Maria do Rosário, em 12 agôsto 1769 em Taquari-RS.

4 F ii. Maria do Rosário foi batizada em 15 agôsto 1753 em Viamão-RS .
Maria casou-se com Antônio Dorneles, filho de João dOrnelas de Souza e Catarina Inácia de Souza, em 13 agôsto 1769 em Taquari-RS. Antônio nasceu em 4 maio 1747 em Vila da Praia, ilha Terceira e foi batizado em 16 maio 1747 em Vila da Praia, ilha Terceira. Ele faleceu em 11 março 1784 em Rio Pardo-RS.

5 F iii. Beatriz das Neves nasceu em General Câmara-RS (Santo Amaro).
Beatriz casou-se com Francisco Dornelas de Souza, filho de João dOrnelas de Souza e Catarina Inácia de Souza. Francisco foi batizado em 28 setembro 1753 em Viamão-RS.

3) JORGE TEIXEIRA DE MELO e CATARINA MACHADO

Primeira Geração

1. Jorge Teixeira de Melo nasceu em Norte Grande, ilha de S.Jorge.

Jorge casou-se com Catarina Machado. Catarina nasceu em Norte Grande, ilha de S.Jorge.

Eles tiveram os seguintes filhos

2 M i. João Teixeira Machado nasceu c.1717 em Norte Grande, ilha de S.Jorge.
João casou-se com Ana Maria de Jesus, filha de João Teixeira Gonçalves e Joana Pereira. Ana nasceu em Norte Grande, ilha de S.Jorge.

3 M ii. Miguel Teixeira de Carvalho nasceu c.1725 em Norte Grande, ilha de S.Jorge.
Miguel casou-se com Maria da Conceição, filha de Antônio Ferreira e Isabel Garcia. Maria nasceu em 30 novembro 1732 em Madalena, ilha do Pico.

4 F iii. Rita Maria da Conceição Teixeira nasceu c.1737 em Norte Grande, ilha de S.Jorge.
Rita casou-se com (1) Francisco Pinto Cezimbra, filho de Francisco Pinto e Maria Rodrigues. Francisco nasceu em 1726 em Vila Franca ou Ponta Delgada, ilha de S.Miguel.
Rita também casou-se com1 (2) José de Souza, filho de Manuel de Souza e Ana de Jesus, em 4 abril 1768 em Triunfo-RS. José nasceu em ilha de São Miguel.

5 M iv. José de Souza Machado nasceu em 1 junho 1735 em Norte Grande, ilha de S.Jorge e foi batizado em 4 junho 1735 em Norte Grande, ilha de São Jorge.
José casou-se com Ana Maria, filha de Lourenço Teixeira Machado e Luzia Gonçalves. Ana nasceu em Vila do Topo, ilha S.Jorge.

6 M v. Bartolomeu Antônio nasceu em 18 agôsto 1739 em Norte Grande, ilha de S.Jorge e foi batizado em 21 agôsto 1739 em Norte Grande, ilha de São Jorge.
Bartolomeu casou-se com Eusébia da Silva, filha de Francisco da Silva (Cardoso) Coutinho e Maria da Assunção, em 1 junho 1761 em Rio Grande-RS. Eusébia foi batizada em 12 março 1749 em Rio Grande-RS .

7 F vi. Catarina Maria nasceu em Norte Grande, ilha de S.Jorge.
Catarina casou-se com (1) Francisco José da Guerra. Francisco nasceu em S.Martinho, Basto (PT).
Catarina também casou-se com1 (2) Fernando de Brito de Oliveira, filho de Raimundo de Brito de Oliveira e Teresa Maria, em 24 janeiro 1761 em Rio Grande-RS. Fernando nasceu em Lisboa (S.José).

8 M vii. Manuel Teixeira de Melo nasceu em Norte Grande, ilha de São Jorge.
Manuel casou-se com Bárbara de Santo Antônio, filha de Silvestre Vieira e Maria do Espírito Santo. Bárbara nasceu em Norte Grande, ilha de São Jorge.

4) MANUEL FERREIRA DIAS e ANTÔNIA PEREIRA


Primeira Geração

1. Manuel Ferreira Álvares Dias nasceu cerca de 1704 em Ribeiras, ilha do Pico.

Manuel casou-se com Antônia Pereira. Antônia nasceu em Norte Grande, ilha de São Jorge.

Eles tiveram os seguintes filhos

2 F i. Maria das Candeias nasceu em 4 fevereiro 1737 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizada em 5 fevereiro 1737 em Norte Grande, ilha de São Jorge .
Maria casou-se com Domingos Francisco, filho de Antônio Perestrelo e Clara Francisca. Domingos nasceu em NSa da Luz, Torres Vedras, Lisboa (Portugal).

3 F ii. Ana Maria Pereira nasceu em 28 outubro 1739 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizada em 29 outubro 1739 em Norte Grande, ilha de São Jorge .
Ana casou-se com José de Souza Valadão, filho de Antônio Machado de Souza e Felipa da Conceição, em 4 abril 1760 em Triunfo-RS. José nasceu em Urzelina, ilha de São Jorge.

4 F iii. Bárbara da Conceição de Quadros nasceu em 1 fevereiro 1746 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizada em 3 fevereiro 1746 em Norte Grande, ilha de São Jorge .
Bárbara casou-se com Manuel Rodrigues da Rosa "Ruivo", filho de João Rodrigues Alvernaz e Ágada Jorge, em 3 outubro 1762 em Triunfo-RS. Manuel nasceu em Salão, ilha do Faial.

5 M iv. Pedro Pereira da Silva nasceu em 28 junho 1749 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizado em 30 junho 1749 em Norte Grande, ilha de São Jorge.
Pedro casou-se com Perpétua Rosa de Jesus, filha de Antônio Caetano e Rosa Perpétua de Jesus, em 4 setembro 1784 em Taquari-RS. Perpétua foi batizada em 25 novembro 1764 em Triunfo-RS .

6 M v. Paulo Ferreira da Silva nasceu em 28 junho 1749 em Norte Grande, ilha de São Jorge e foi batizado em 30 junho 1749 em Norte Grande, ilha de São Jorge.
Paulo casou-se com Brígida Maria da Conceição, filha de Manuel Teixeira de Quadros e Mariana de Jesus. Brígida nasceu em 25 março 1756 em Viamão-RS.


domingo, 30 de novembro de 2008

Mitologia 27: As Genealogias de Argos (parte 5)

Durante a terceira fase das dinastias de Argos, quando os mitos de Perseu estão estabelecidos, o trono de Argos passa para outra família, a de Bias e Melampo, vindos da Tessália. A explicação mitológica é que as filhas de Preto foram enlouquecidas por Dioniso e convertidas em vacas. Salvas pelos conhecimentos do adivinho Melampo, um descendente de Éolo e de Deucalião, acabam sendo desposadas pelos irmãos tessalianos, e com isso estes ganham um quinhão das terras, passando a reinar em dois terços de Argos, enquanto que as linhagens argivas originais passam a Micenas e Tirinto, onde os mitos de Héracles irão transcorrer. Seriam estes Eólidas os patronos divinizados de uma migração de gregos eólios? Uma migração vinda do norte anterior à invasão dória?
Argos e Tessália possuíam histórias míticas bem diferentes, e apesar das diversas tentativas de fusão e sincronização, as divergências eram evidentes. Nos mitos argivos, Foroneus foi o primeiro homem, sobreviveu ao Dilúvio, e trouxe o fogo para os homens, enquanto que para os tessálios, o primeiro homem foi Deucalião, filho de Prometeu, o titã que roubou o fogo para dar aos mortais. Temos assim duas mitologias paralelas, mais tarde unificadas de uma maneira um tanto artificial.


Mitologia 26: As Genealogias de Argos (parte 4)


Na postagem anterior, comecei a discorrer sobre possíveis explicações para a presença de egípcios e fenícios entrelaçados às genealogias de Argos.
Em dado momento de sua história, os argivos sentiram-se compelidos a explicar o mundo à sua volta ajustando-os a seu mitos autóctones. O episódio de Io transformada em vaca por Hera, lembra o mito indiano de Sâmdhya (em algumas versões, Parvati, a esposa de Shiva) deusa do crepúsculo, que foi perseguida pelo próprio pai (conforme a versão, Brahma ou Prajapati), e fugiu na forma de uma corça. O deus lascivo tomou a forma de um cervo, mas acabou decapitado por Rudra-Shiva. Pode haver uma remota origem indo-européia neste mito, mas podem haver elementos autóctones envolvidos. O filho desta união, Épafo, não tem nenhuma função a não ser a de iniciar uma dinastia egipcia. Sua filha Libya, é apenas um epônimo "vazio" para a Líbia, talvez representando as colônias gregas naquela região. É amada por Possídon e gera um casal de gêmeos, Agenor e Belo, um tema recorrente na dinastia, já que no início dela Níobe já havia gerado de Zeus os irmãos Pelasgo e Argo; e posteriormente teremos os gêmeos rivais Dânao e Egito, e seus descendentes Acrísio e Preto. Héracles e Íficles também formam outro par de gêmeos, embora sem a inimizade uterina. Temos assim a duplicação de um tema básico, o de gêmeos rivais, ascendentes de povos afins. Alguns tentam explicar o nome Agênôr, na interpretação grega, "herói (ânôr) que conduz (agein)", como a forma helenizada de uma palavra pré-grega, talvez cognato de Kana'an (Canaã), que usualmente se deriva da raiz semítica KN` "tintura vermelha". Outra possibilidade seria relacioná-lo a ôgênos, forma dialetal de ôkeanos, "oceano". Teríamos uma forma pré-helênica *augayana-, presente também em Augeias, Ôgygos e Aigina? Não passam de palpites. Agenor também aparece na primeira fase da dinastia argiva, como um bisneto ou neto do Argo original, o que indica que o nome já possuía um significado próprio para os argivos. Talvez o Ôgygos tebano (pai de Cadmo) fosse uma variação local do mesmo Agenor cretense (pai de Europa) e do Agenor argivo (que divide a soberania do lugar com seus irmãos Pelasgo e Íaso).
Este Agenor "primitivo" herdou a cavalaria de Argos, e com ela desalojou os irmãos Íaso, senhor do Oeste, e Pelasgo, fundador de Larissa. Era filho de Tríopas e Sósis (segundo Pausânias) , ou de Écbaso (segundo Apolodoro). A versão pausaniana nomeia os filhos de Argo como dois, de nomes Píraso (ou Píren, ou Piras) e Forbas, que gera Tríopas e Messene, com Tríopas gerando quatro filhos. A versão apolodórica faz de Argo pai de quatro filhos: Écbaso, Piras, Epidauro e Críaso, sendo este o pai de Forbas. Temos assim personagens semelhantes mais arranjados de forma diferente. Como desatar este nó?
Agenor também é o nome de um personagem árcade, filho do rei Fegeu, irmão de Foroneu. Esta filiação possui complicações cronológicas, já que ele é contemporâneo de Orestes, um personagem muito posterior a Foroneu.

Mitologia 25: As Genealogias de Argos (parte 3)

Na postagem anterior, eu dividi as genealogias de Argos em cinco etapas, e assim espero ter um base para prosseguir em minha análise.

  1. Primeira fase: Foroneu até Gelanor
  2. Segunda fase: Danaides até Abas
  3. Terceira fase: Acrísio até Perseu
  4. Quarta fase: Perseu até Héracles
  5. Quinta fase: Heráclidas

Se a invasão dória de 1 200 aC for mesmo vinculada à última fase, poderíamos arriscar em atribuir os mitos da terceira e quarta fases ao período micênico. Nestas fases, os eventos envolvem uma série de cidades vizinhas e de grande importância no período micênico, tais como Tirinto, Midéia, e a própria Micenas. É tentador considerar a primeira fase fundadora como um substrato pré-grego, já que é nela em que estão "ancorados" os vizinhos rústicos dos argivos citadinos, os árcades e os pelasgos, mas isto pode ser apenas uma possibilidade. A falta de dados torna o estudo muito nebuloso, e todas as afirmativas devem ser feitas com uma boa dose de interrogações.
Se os Heráclidas, que voltam do norte para invadir a Argólida representam uma versão épica da migração dória, como explicar sua vinculação com o herói supostamente autóctone Héracles? O fato de Héracles estar associado a Argos, Tirinto e também a Tebas, poderia ser uma pista para a suposta paternidade "argiva" do tebano Cadmo, conectado ao asiático Agenor e à cretense Europa. O período micênico marcou um momento de expansão marítima da Grécia, e foi aí quando os sacerdotes helênicos viram-se "obrigados" a explicar mitologicamente os povos estrangeiros. Isto é coerente com o cenário genealógico: A segunda fase da dinastia integra os egípcios, líbios, fenícios e mesopotâmios no contexto grego. Coincidentemente muitos destes mesmos povos estão agrupados em outra genealogia mítica, a do Gênesis Hebraico, onde líbios, egípcios, cretenses e cananeus aparecem como descendentes dos filhos de Kham.
Foi neste momento que os argivos "criaram" uma origem fenícia para o tebano Cadmo, e mais do que isso, uma origem argiva para estes fenícios. A ligação de Cadmo com os fenícios pode ter bases reais (Kadmos parece ser uma palavra de origem semítica, qdm, significando "primeiro", ou "oriental"). Os egípcios ganharam um epônimo helenizado, Aigyptos, e ficaram assim "subordinados" a uma assumida precedência helênica sobre eles. O processo de amálgama e de sincronia entre as diversas genealogias pode ter sido consolidado na fase pós-alexandrina, talvez em Alexandria. Sendo uma cidade egípcia fundade pelos gregos, talvez tenha sido a sede da "fábrica" de genealogias míticas mesclando diversas cidades e lugares. Neste caso, deveríamos descartar todos os elementos não-gregos como acréscimos posteriores.
Minha hipótese é que as Danaides na origem eram mulheres vindas "do mar", assim como as Amazonas, as Haliai, as Nereidas e as Bacantes; mais tarde o aspecto mítico foi "humanizado", e passaram a ser consideradas como mulheres do além-mar, ou seja do Egito. Sua chegada está vincula ao episódio de uma grande peste que assolou Argos após a morte de Lino, filho da princesa Psâmate ( Psammathê) (filha de Crotopo) e do deus Apolo, despedaçado por cães. Esta lenda está vinculada ao culto de Apolo Lício, o "Apolo-Lobo", que enviou um monstro lupino de nome Poine para assolar a cidade, em represália à morte do filho pelo avô Crotopo. A relação de inimizade entre avô e neto lembra a de Acrísio e Perseu. Seriam duas formas divergentes do mesmo mito? Seria o trio Crotopo-Psâmate-Lino análogo a Acrísio-Dânae-Perseu? Os argivos relembravam o triste fim de Lino com um ritual onde sacrificavam-se cães (isto lembra o episódio de Hermes matando Argos, que às vezes é descrito como um cão de guarda). Dânao torna-se rei de Argos após um prodígio divino, quando um lobo monstruoso devorou um touro. Os habitantes do lugar associaram Dânao ao símbolo do lobo, mas uma associação ao culto de Apolo Lício (Apollôn Lykios, Απολλων Λυκιος).
Continua mais tarde...

Mitologia 24: As Genealogias de Argos (parte 2)


Continuando as minhas divagações sobre Argos...
Algo que salta aos olhos quando vemos as genealogias dos reis argivos de uma perspectiva geral é a forma como uma série de tradições diversas foram "costuradas" em uma extensa árvore genealógica. O ramo descendente da princesa Io inclui personagens que extrapolam o contexto de Argos e de sua região, a Argólida:
  1. Agenor (Agênôr), rei da Síria, esposo de Telefassa (ou Argíope) , foi pai de Cadmo (Kadmos), Fênix (Phoinix), Cílix (Kilix), Taso (Thasos) e Europa (Eurôpa). Cadmo será o fundador mítico da cidade grega de Tebas, na Beócia; Fênix é o epônimo da Fenícia; Cílix da Cilícia; Taso da ilha de Tasos; Europa foi raptada por Zeus em forma taurina e tornou-se a mãe do grande rei cretense Minos.
  2. Belo (Bêlos), rei do Egito, e pai de Dânao e Egito, e seu nome remete-nos ao deus semítico *Ba`lu (babilônio Bel, cananeu Baal).
A ligação da genealogia argiva com povos estrangeiros parece obviamente ser um acréscimo posterior, um "apêndice" incorporado às tradições locais para explicar uma série de povos vizinhos. Da mesma forma, a lenda de Io, foi progressivamente remodelada para explicar uma série de eventos: o nome do Mar Jônico; o nome do Estreito de Bósforo (em grego Bôsporos, "passagem da vaca"); e até o culto egípcio à deusa-vaca, na forma de Ísis (então confundida pelos helênicos com a "genuína" deusa-vaca Hátor). Tratam-se de etimologias populares, formuladas a partir de semelhanças fortuitas entre nomes. As tradições vinculam Argos ao Egito podem ter uma base real, e isto vem sendo estudado por autores como Martin Bernal, autor de Black Athena. Neste livro ele defende a tese de que a cultura grega tem raízes afro-asiáticas, especialmente na Fenícia e no Egito, o que seria confirmado pelos mitos de fundação de diversas cidades helênicas, como Tebas, Argos e até Atenas. Embora suas teses sejam polêmicas, e tenha sofrido muitas contestações, o livro levanta alguns questionamentos interessantes. É sabido por exemplo que Io, no dialeto argivo (), significava "lua", muito similar à palavra egípcia para lua, yah. Esta palavra pode também estar na raiz do nome Íaso (Iasos). Mesmo que as raízes egípcias de Argos venham a ser confirmadas, a inclusão de tantos povos vizinhos numa genealogia local parece ser um acréscimo posterior.
Teríamos assim uma genealogia "original", que vai do patriarca Foroneu até o rei destronado Gelanor. A partir daí o que temos é uma "costura" que incorpora elementos egípcios, asiáticos e beócios à genealogia argiva. Existiam tradições locais beócias divergentes sobre a origem do herói Cadmo, nas quais ele era filho do herói tebano autóctone Ógigo (Ôgygos); Cílix, Fênix e Taso são personagens "vazios", dos quais nenhuma lenda particular existe, constando apenas como irmãos que ajudam seu pai a buscar pela irmã raptada; aparecem para explicar uma série de países vizinhos, assim como as colônias fenícias na ilha de Tasos. Belo pode ser uma helenização do Bel mesopotâmico e do Baal fenício (provavelmente), e Egito é apenas mais um epônimo (epônimo é um personagem que dá nome a um lugar).
A lenda original das Danaides parece falar de um grupo de mulheres vindas do mar para morrer em Argos. Acredito que elas fossem inicialmente uma raça de seres míticos, como as Sereias, Nereidas e Amazonas. Escrevi sobre isso na minha primeira postagem sobre A Origem das Amazonas. Mulheres aquáticas e ferozes, que invadiram a terra e foram derrotadas, talvez seu nome original fosse Danaides, e o nome Dânao tenha sido "fabricado" para dotá-las de um pai humano. No entanto, dânaos é um nome étnico, que designa um povo grego, e é visto como muitos como relacionado ao misterioso povo dos Deneen que invadiu o Egito com as hordas dos Povos do Mar, em 1 200 a.C. Outras possibilidade vinculam este nome ao indo-europeu *Danu-, "água, rio, deusa-rio", e até mesmo à tribo israelita de Dan. A mesma raiz aparece no nome da princesa Danae, mãe de Perseu. A proto-forma dos nomes era *DanaFos e *DanaFâ, onde o "F" é um digamma, uma letra grega equivalente ao sol de "w", e que foi suprimido do alfabeto na maioria dos dialetos clássicos. Danaides foram mortas por Linceu (esposo da única sobrevivente, Hipermnestra) e sofrem no Tártaro por terem assassinado os maridos, sendo obrigadas a eternamente encher um ânfora de água usando peneiras.

Ou seja, as primeiras gerações da casa real argiva terminam com a invasão de uma raça mítica de mulheres aquáticas, que são "derrotadas" e "domadas", de forma a legitimar uma série de tradições patriarcais. Quem seria este Linceu? O nome grego, Lygkeus, é tradicionalmente vinculado à palavra lygx, "lince", mas não deve passar de uma etimologia popular. Será que Linceu está vinculado a outros nomes como Licaon, Locro, Lico ou Licoreu? Linceu é também o nome de um dos gêmeos semidivinos da cidade vizinha de Messene, sexto-neto do primeiro, indicando que o nome era recorrente na linhagem.
Com Linceu, temos assim a segunda "fase" das genealogias argivas, com uma sucessão de nomes que faz a ponte para o próximo grande evento do clã argivo: o mito de Perseu, com seu avô Acrísio e sua mãe Dânae. Após Perseu, seguem-se mais uma série de nomes até a figura de Héracles, cujos descendentes, os Heráclidas, foram expulsos da região, e voltariam mais tarde para tomar o poder.
Como explicar estas "costuras"? Seriam diferentes estratos sobrepostos, talvez representando diferentes correntes colonizadoras da região? Os argivos falavam um dialeto dório, correspondendo à última das migrações que povoaram a Grécia. Os dórios sobrepuseram-se a um dialeto anterior possivelmente aparentado ao arcadiano. Tradicionalmente a camada mítica que representa a invasão dória é considerada como sendo a dos Heráclidas, uma série de mitos fundadores que contam estes invadiram o Peloponeso e e vingaram-se dos seus inimigos.
Termino esta postagem com o resumo da divisão que proponho para a dinastia argiva:
  1. Primeira fase: Foroneu até Gelanor
  2. Segunda fase: Danaides até Abas
  3. Terceira fase: Acrísio até Perseu
  4. Quarta fase: Perseu até Héracles
  5. Quinta fase: Heráclidas